Possibilidade de retirada de radares pode incentivar comportamento de risco no trânsito
Possibilidade de retirada de radares pode incentivar comportamento de risco no trânsito
Especialista aponta que essa é uma decisão que pode fazer com que o Brasil engate a marcha à ré na segurança viária.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a defender, no início do mês, a retirada dos radares em rodovias federais. De acordo com reportagem publicada pela Folha de S.Paulo, a afirmação foi feita a simpatizantes do presidente, que disse que levará o assunto novamente ao ministro Tarcísio de Freitas, da Infraestrutura.
De acordo com Bolsonaro, o motorista não pode se preocupar com os radares. “Não pode o motorista estar muito mais preocupado com o que tem no barranco para fotografá-lo do que com a sinuosidade da pista. Isso leva a acidente também”, disse.
Essa não é a primeira vez que o presidente manifesta suas intenções em relação ao tema. Um decreto do governo, em 2019, retirou radares de velocidade de rodovias federais, porém a decisão foi suspensa pela Justiça Federal.
Estudos internacionais
Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS), o aumento na velocidade média está diretamente relacionado tanto à probabilidade de ocorrência de um acidente quanto à gravidade das suas consequências. Cada aumento de 1% na velocidade média produz, por exemplo, um aumento de 4% no risco de acidente fatal e um aumento de 3% no risco de acidente grave.
O risco de morte para pedestres atingidos frontalmente por automóveis aumenta consideravelmente (4,5 vezes de 50 km/h para 65 km/h).
O Insurance Institute for Highway Safety (IIHS), organização independente financiada pelas seguradoras americanas, apontou em 2014 que a instalação de radares levou a uma mudança de longo prazo no comportamento de motoristas. Levou, também, à “redução substancial” de mortes e ferimentos no condado de Montgomery, próximo a Washington, nos Estados Unidos.
A London School of Economics and Political Science (LSE) obteve resultados parecidos com o do instituto norte-americano. A universidade britânica analisou cerca de 2,5 mil pontos monitorados na Inglaterra, na Escócia e no País de Gales, baseado em órgãos locais e no Departamento de Transporte (DfT).
Segundo a universidade britânica, de 1992 a 2016, o número de acidentes nesses países caiu em até 39%. Enquanto o número de mortes diminuiu até 68% no perímetro de 500 metros dos novos radares de velocidade instalados.
A cerca de 1,5 km das câmeras, os acidentes voltam a ser mais recorrentes. Por isso, o estudo britânico sugere a cobertura de uma área maior pela fiscalização.
Comportamento de risco no trânsito
Para Adriana Modesto, sanitarista, mestre em Ciências da Saúde e doutora em Transportes pela Universidade de Brasília (UnB), sem fiscalização é possível que o Brasil engate marcha à ré na segurança viária.
“Com a retirada dos radares de velocidade das rodovias brasileiras, demanda manifestada pelo chefe do executivo, infere-se que comportamentos de risco sejam fomentados. E que o que se avançou no Brasil quanto a redução no número de sinistros de trânsito tendo como referências modelos e experiências internacionais de boas práticas de segurança no trânsito, assuma tendência diversa da observada nos últimos anos fazendo com que o Brasil engate marcha à ré na segurança viária”, argumenta.
Ainda conforme a especialista, a adoção de recursos, como os radares de velocidade, visa a redução e severidade dos sinistros de trânsito. “A eficácia na utilização dos equipamentos é ratificada tanto pela literatura especializada, como por programas governamentais como o Programa Nacional de Controle Eletrônico de Velocidade – PNCV. Além das estatísticas de órgãos de trânsito que revelam a redução do número dos referidos eventos a partir do emprego desses equipamentos”, relata.
Modesto diz ainda que naturalmente para se abordar a transgressão quanto à velocidade determinada para o trecho da via, é necessário reiterar a questão dos riscos que cada pessoa está disposta a assumir. Essa conduta é potencialmente influenciada por fatores macroeconômicos, culturais, sociais e psicológicos.
“Haverá condutores veiculares inclinados ao risco a despeito dos potenciais danos ou penalidades que lhes possam ser imputadas”, conclui.
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